Bônus para mães na reforma da Previdência não diminui desigualdades, dizem especialistas

Bônus para mães na reforma da Previdência não diminui desigualdades, dizem especialistas

A proposta da reforma da Previdência do governo do presidente da República Jair Bolsonaro estuda permitir benefício para mulheres com filhos. No entanto, a aposentadoria adiantada para mães não diminuirá a desigualdade de gênero. As informações foram coletadas de especialistas pelo jornal “O Globo”.

A medida da nova proposta da reforma da Previdência estudada antecipar a aposentadoria em um ano para cada filho da mãe em questão. Contudo, há o limite de três filhos para a antecipação.

Segundo analistas, tal medida não compensa a dupla jornada enfrentada também pelas mulheres sem filhos.

Dentre outros motivos, a desigualdade de gênero não será amenizada com a medida pois:

  • Defasagem de contribuição previdenciária: em ocupações mais precárias, a tendência é que as mulheres iniciem o plano previdenciário tardiamente em relação aos homens.
  • Salários menores: a média salarial feminina é 25% mais baixa em relação à média salarial masculina.
  • Desemprego: a falta de emprego atinge 13,6% das mulheres, enquanto nos homens o impacto é de 10,5%.

É injusto com as mulheres que não têm filhos, porque sobre elas também recaem os afazeres domésticos e o cuidado com os idosos da família. Na Europa, essa discussão é a ordem do dia, porque o envelhecimento da população está pesando sobre as mulheres

Lucilene Morandi

Morandi defende que o benefício seria adequado se fosse um adicional a uma idade mínima menor para toda a população feminina.

Por sua vez, Lena Lavinas, professora da UFRJ, observa que a medida não tem efeito reparador porque a taxa de fecundidade das mulheres vem caindo desde o final dos anos 1960 no país.

Na década de 1950, a média era de seis filhos, hoje é de 1,7.

“A taxa de fecundidade despencou. Qual o crédito de aposentadoria que ela vai conseguir? Um ano, dois no máximo. Eles acham que as mulheres vão ter mais filhos? Claro que não. Essa conta não se sustenta”, disse Lavinas ao jornal “O Globo”.

Lavinas também é a favor da redução da idade mínima de aposentadoria para mulheres. Os argumentos da professora envolvem as desigualdades no mercado de trabalho e na divisão das tarefas domésticas.

De acordo com Lavinas, a política de dar bônus às mães existe em países como Chile, Noruega, Suíça e Suécia. Todavia, tal política é acoplada a outras medidas, como a complementação da contribuição.

Número de mulheres que decidiu sair de casa para trabalhar cresceu 9,2% em quatro anos

Número de mulheres que decidiu sair de casa para trabalhar cresceu 9,2% em quatro anos

Nos últimos quatro anos, a necessidade de aumentar a renda familiar, corroída pela inflação e pelo desemprego, acelerou o crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho, movimento observado desde os anos 1990. Entre o terceiro trimestre de 2014 e o mesmo período de 2018, quatro milhões de mulheres decidiram sair de casa para trabalhar, um crescimento de 9,2%, segundo dados da pesquisa Pnad Contínua, do IBGE. No entanto, três em cada quatro delas ainda buscam uma ocupação. E boa parte das que conseguiram trabalho está na informalidade.

Com esse acréscimo em quatro anos, as mulheres já representam 44,6% do mercado de trabalho. Em 2014, no início da crise econômica, elas eram 43,3%. Os homens ainda são maioria, 55,4%, mas esse percentual caiu desde 2014, quando correspondiam a 56,7%. Em quatro anos, o número de homens disponíveis para o trabalho aumentou em ritmo menor, 3,9%, resultando num acréscimo de 2,2 milhões de indivíduos.

— Na crise, mulheres e homens foram afetados pelo desemprego. Mas, enquanto as mulheres têm se mostrado mais persistentes na procura, os homens têm ido para a inatividade — diz Thaís Barcellos, economista da Consultoria iDados.

Essa maior resiliência, segundo especialistas, está ligada a dois fatores: a maior escolaridade feminina — elas já são maioria no ensino superior — e os movimentos por igualdade de gênero, que se acentuaram no mesmo período da recessão. Regina Madalozzo, economista do Insper especializada na atuação da mulher no mercado de trabalho, diz que as mulheres ganharam mais confiança:

— Um grupo maior de mulheres desempregadas, ainda que seja uma estatística triste, tem uma perspectiva positiva. Se elas foram buscar trabalho, é porque se sentem capazes de conquistar uma vaga — diz Regina, para quem o avanço da escolaridade é um importante instrumento de inclusão da mulher. — Um exemplo é a Coreia do Sul. Mesmo sendo um país mais conservador, em que depois de ter filhos as coreanas tendem a ficar mais tempo fora do mercado, nas crises econômicas elas voltam mais rapidamente ao trabalho em razão do alto nível de instrução, que lhes traz confiança de êxito.

Hoje, no Brasil, do total de mulheres com idade para trabalhar (acima de 14 anos), 52,5% estão no mercado, segundo o IBGE. Esse percentual cresceu em relação a 2014, quando era 50,4%, e é maior que a média mundial atual para elas (48,5%), segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT).

As mulheres que conseguiram uma ocupação durante a crise não ganharam postos que os homens perderam. Elas estão criando os seus próprios empregos. Fazendo sabonete artesanal, biscoitos, roupas

Lucilene Morandi
A Constituição Federal de 1988  e as lutas feministas na Área do  Trabalho: avanços e derrotas

A Constituição Federal de 1988 e as lutas feministas na Área do Trabalho: avanços e derrotas

Hildete Pereira de Melo
Doutora em Economia, Professora Associada IV da Universidade Federal Fluminense.

Este texto revisita os avanços e derrotas obtidos no mundo do trabalho pelas lutas das mulheres e das entidades feministas no processo constitucional de 1987/88.

Na primeira parte, explicita a conjuntura política e os momentos de tensão das lutas feministas e de mulheres frente à ruptura com um Estado autoritário, que culmina com a criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e da redação da “Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes” e sua proposta de reivindicações para construção da igualdade entre os sexos e as raças no campo das relações de trabalho.

Na segunda, faz um breve resumo das lentas conquistas obtidas pelas mulheres a partir da promulgação da CLT, em 1943, e da denúncia feminista da invisibilidade do trabalho das mulheres para a reprodução da vida.

E nas conclusões, a grande derrota de não ter incluído as emprega- das domésticas no conjunto da legislação previdenciária nacional.

Seminário promovido pelo Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro – EMERJ

Mulheres que saem do mercado após ter filhos, só retornam em posições menores

Mulheres que saem do mercado após ter filhos, só retornam em posições menores

Vanessa Gabriel sempre sonhou com a carreira de atriz e começou a fazer campanhas comerciais a partir dos quatro anos. Entretanto, mais tarde, uma notícia interrompeu a carreira: uma gravidez inesperada.

Eu tive sorte que eu estava no final de um papel, então tive direito à licença-maternidade. Mas, como engordei 30 quilos na gravidez, não consegui outros papéis.

Vanessa Gabriel

Estar presente na infância do filho foi a escolha da jovem, de 28 anos, que passou a contar com o apoio financeiro da mãe e do marido. Porém, quando a criança completou dois anos, Vanessa achou que era a hora de retornar, mas não conseguiu vagas nem como atriz, nem como publicitária, sua formação acadêmica.

De acordo com a doutora em economia Lucilene Morandi, as mulheres se tornam menos competitivas que os homens durante a idade fértil, seja porque optam por trabalhos de meio período, ou porque saem de seus cargos para cuidarem dos rebentos. Somente a partir dos 40 anos, a diferença salarial entre os sexos se torna menos significativa.

-Nessa volta, a maioria das mulheres volta em cargos menores. Por isso, é importante a prática, já adotada em países mais desenvolvidos, de ofertar cursos de treinamento para essas mulheres, como incentivo para que elas voltem ao mercado de trabalho.

Para conseguir algum tipo de renda, Vanessa começou a trabalhar freelancer como modelo de maquiagens. A jovem recebe por diária de maquiadores que precisam demonstrar suas técnicas em cursos de beleza. Segundo a doutora em economia, Hildete Pereira, em 1991, o PIB per capita feminino era 27% do masculino, já em 2015, apesar de a escolaridade das mulheres ser maior que a dos homens, o PIB feminino ainda representa só 57% do deles.

A escolaridade foi um prêmio, mas ela não resolveu a desigualdade.

Metade das novas empreendedoras abre negócio por necessidade

Metade das novas empreendedoras abre negócio por necessidade

Entre as novas empresárias, 48% iniciam a atividade porque precisam complementar a renda ou buscam recolocação no mercado de trabalho, é o que revela a pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM) 2016. Esse número cai para 37% quando se trata de homens.

Conciliar o trabalho profissional, de carteira assinada, e o cuidado dos filhos é tarefa difícil para muitas mulheres. Isso porque, de acordo com a doutora em economia Hildete Pereira, apenas 30% das crianças brasileiras entre 0-3 anos de idade conseguem vagas em creches públicas. Segundo a também doutora em economia Lucilene Morandi, no Brasil, há a cultura de o trabalho doméstico feminino ser substituído pelo trabalho de outra mulher contratada. Entretanto, quando a família não tem condições de arcar com tal despesa, muitas avós assumem a responsabilidade pelas crianças.

-É possível notar um pico de horas gastas no trabalho doméstico, declaradas pelas mulheres acima de 60 anos na pesquisa do IBGE [PNAD Contínua], o que mostra a nova tendência de muitas avós entrarem em ação para ajudar as filhas. – analisa.

Lucilene Morandi

Porém, nem sempre é possível arcar com os custos de uma babá, uma creche particular ou ter o auxílio de algum parente, o que impulsiona mães a deixarem seus empregos formais, como a maquiadora Vivian Alvarenga, após o nascimento do seu segundo filho.

-O valor que eu ganhava de salário era quase igual ao que eu tinha que pagar para a moça que cuidava deles. Então resolvi colocar na balança, pedir demissão e fazer um curso de maquiagem, para ter mais flexibilidade.- explica Vivian.

De acordo com a pesquisa ‘Donos de Negócio no Brasil’, do Sebrae, entre 2001 e 2014, o número de brasileiras empresárias cresceu 34%, sendo que 35% dessas mulheres empreendem em casa. Nos dois primeiros anos como autônoma, Vivian viu a renda declinar, mas conquistou clientela e não se arrepende da escolha.

-Hoje eu consigo ser mais mãe, que antes. Sinto não ter aproveitado fases da infância deles e, embora eu não tenha mais um salário fixo por mês, acho que trabalhar com o que você ama não tem preço. – conclui.

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